Não coçar os olhos pode evitar ceratocone

Não coçar os olhos pode evitar ceratocone, principal causa de transplante de córneas no país

Caracterizada pelo afinamento ou aumento da curvatura do tecido da córnea, doença atinge uma em cada vinte mil brasileiros

Doença que atinge uma em cada vinte mil pessoas no Brasil e principal causa de transplante de córneas no país, o ceratocone pode ser evitado a partir de um ato simples: não coçar os olhos. Como é mais comum em pessoas que esfregam a área dos olhos e em quem já tem astigmatismo e miopia, a recomendação dos oftalmologistas é evitar esse hábito que pode parecer inofensivo, mas que pode trazer danos irreversíveis à visão.

O ceratocone é uma alteração na córnea caracterizada pelo afinamento ou aumento da curvatura do tecido. Em vez de ter o formato de uma bola de futebol cortada ao meio, considerada a forma normal da córnea, ela passa a ter a configuração semelhante a um cone. Essa deformação costuma ocorrer na adolescência e progride até por volta dos 30 anos.

Aos 17 anos, a universitária Mylena Pontes foi diagnosticada com a doença. Até receber a confirmação, tinha dificuldades para acompanhar os slides que os professores passavam nas aulas de medicina veterinária. O uso do celular e de aparelhos eletrônicos era limitado, pois a vista rapidamente ficava embaçada. “Eu não conseguia ver televisão ou ficar olhando para a tela do telefone por muito tempo. Além disso, o olho coçava muito. Cheguei a ferir a pálpebra de tanto esfregar”, conta.

Mylena, hoje com 18 anos, usa óculos desde os 5. Tem miopia e astigmatismo e, para acompanhar a evolução dos erros refrativos, faz exames oftalmológicos anualmente. No ano passado, em uma consulta de rotina, surgiu a primeira suspeita de ceratocone. “Ficamos muito assustados com o nome e com a informação de que não havia cura. A médica que fazia os nossos exames de rotina disse que não era especialista e nos orientou a procurar um profissional especializado em córnea”, lembra a mãe de Mylena, a comerciante Cristina Pontes, 44.

A família, de Ribeirão, Mata Sul do estado, procurou especialistas no Recife para fazer o tratamento adequado. “Nosso susto também veio do fato de uma prima minha ter a doença diagnosticada cerca de seis meses antes de Mylena. Como ela estava grávida quando os sintomas apareceram, esperou o fim da gestação para se tratar. Acabou sendo tarde e ela vai precisar fazer um transplante de córnea”, lamenta Cristina.

No caso de Mylena, como o diagnóstico foi feito rapidamente, o transplante – solução para casos mais avançados – não foi necessário. No consultório do oftalmologista, recebeu a boa notícia de que a doença tem tratamento e que o transplante pode ser evitado. “O primeiro tratamento do ceratocone é o uso de óculos. Quando a gente não consegue uma qualidade de visão boa com ele, parte para a lente de contato, que consegue corrigir um pouco melhor a irregularidade da córnea e formar visões mais nítidas”, explica a oftalmologista do Hospital de Olhos de Pernambuco (Hope) Mirella Molnar Maranhão, especialista em córnea e lentes de contato.

À universitária foi recomendado o tratamento por crosslinking, uma cirurgia ambulatorial em que se aplica radiação ultravioleta associada à vitamina B2 para aumentar a resistência da córnea em até três vezes. “Um ano depois de receber o diagnóstico, fiz o crosslinking. Aproveitei as férias da faculdade, em julho, para fazer. O médico disse que os resultados aparecem com até seis meses, mas já senti algumas melhoras. Meus olhos coçam menos, por exemplo”, ressalta Mylena. Pesquisas apontam que o procedimento leva a progressão em 87% dos participantes e proporcionar um ganho de visão para 47%, embora esta não seja o principal objetivo da cirurgia.

Segundo a oftalmologista, o principal sintoma do ceratocone é a baixa visão. “A pessoa passa a ver turvo mesmo usando óculos”, esclarece Mirella. A médica explica que a doença pode aparecer sozinha ou acompanhada. “Uma condição (que pode fazer o ceratocone aparecer) é a conjuntivite alérgica, por exemplo. É comum também em pacientes com Síndrome de Down”, afirma.

Na conjuntivite, como o principal fator ambiental de evolução do ceratocone é coçar os olhos, a recomendação médica é não colocar as mãos na região. Enquanto esfregar a área é o principal agente externo, componentes genéticos são a principal causa interna da doença. “Avaliar se tem alguém na família com a doença (principalmente parentes de primeiro grau) e monitorar com frequência são as recomendações básicas”, destaca o oftalmologista especialista em córnea e doenças externas do Hope, Bernardo Cavalcanti,

Em 2017, o Brasil teve a maior demanda por transplantes de córnea dos últimos oito anos. Apenas no ano passado, 24,5 mil brasileiros foram registrados no banco de dados da Associação Brasileira de Transplante de Órgão (ABTO), dos quais 15,2 mil passaram pelo transplante e 9,3 mil permaneceram na fila de espera até dezembro. O ceratocone respondeu por sete em cada 10 transplantes no país. Com o desenvolvimento das tecnologias, porém, o transplante de córnea tornou-se o último recurso para tratar a doença. “No caso do ceratocone, não é um transplante normal, mas apenas da parte interna, o que reduz a chance de rejeição”, esclarece Bernardo Cavalcanti.

Fonte: Diário de Pernambuco

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